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Há 522 anos, desde quando o Brasil foi oficialmente descoberto pelos portugueses, os índios que moram neste imenso território, evocam a proteção do que acreditam como sagrado para clamar por justiça pela posse da terra a quem tem direito e, assim, puderem viver dignamente em paz. O clamor pela fé e a cultura é quase tudo o que resta para uma etnia que, ao longo de séculos, foi e continua sendo maltratada, abandonada e humilhada pelo poder público.
Nesta terça-feira,19 de abril, dia em que o homem branco escolheu para homenagear os povos indígenas brasileiros, os protagonistas da data são unânimes em afirmar: “Não há o que celebrar, porque não temos terra para nossa gente”.
A declaração é do líder indígena alagoano Gecinaldo Xucuru-Kariri, da aldeia Fazenda Canto – Terra Indígena Xucuru-Kariri, localizada no emblemático município Palmeira dos Índios, Agreste alagoano. Ele conta que, assim como em todo Brasil, os índios de Alagoas continuam a amargar um cotidiano de escassez econômica e social que, em algumas comunidades, beira a pobreza extrema. Ele destaca a necessidade de regularização fundiária por parte do governo federal da maioria das aldeias em Alagoas.
“O panorama dos povos indígenas em Alagoas e em todo o país é bem complexo, diante dos inúmeros ataques (aos povos) do atual governo. É lamentável a situação que os povos se encontram, onde há uma agenda anti-indígena. Onde há a lei que diz que o governo deve fazer a proteção dos povos indígenas, a gente vê um massacre, uma guerra declarada. Não há o que comemorar (neste Dia do Índio)”, assegura Gecinaldo.
Oficialmente falando, das treze etnias indígenas localizadas em Alagoas, apenas três, a Xucuru-Kariri (Palmeira dos Índios), a Kariri-Xocó (Porto Real do Colégio) e a Wassu Cocal (Joaquim Gomes) estão com seus territórios “em fase de declaração”. O que significa dizer, na prática, que o processo de demarcação de terras está mais adiantado que os demais, contudo, nenhum deles foi concluído e, portanto, não há um único pedaço de terra em solo caeté que pertença de direito total a uma aldeia indígena.
E o mais grave: não há perspectivas de melhoras, diante do posicionamento do atual governo. Pelo contrário. O futuro, na visão dos indígenas alagoanos, é incerto, nebuloso e obscuro. Em Alagoas, segundo dados do Núcleo Acadêmico Afro, Indígena e Direitos Humanos (NAFRI-DH) da Faculdade Cesmac, um dos principais órgãos de pesquisa sobre os indígenas alagoanos, coordenado pelo professor doutor Jorge Vieira, em todo o estado há aproximadamente 23 mil indígenas vivendo nas aldeias e uma parte em cidades por falta de terras. O núcleo tem promovido esta semana eventos em defesa dos índios alagoanos nas cidades de Arapiraca, Palmeira dos Índios e Maceió (Veja vídeo abaixo).
“Desde que esse governo (o do presidente Jair Bolsonaro) assumiu, tudo ficou mais difícil. Esse governo se porta como inimigo das comunidades indígenas. É tudo muito conflituoso. Desde o início da gestão até agora, um milímetro de terra sequer, em todo território nacional, foi demarcado”, lamenta Antônio Kalankó, um dos líderes da etnia Kalankó, localizada em Água Branca, Alto Sertão alagoano.
E é no Alto Sertão que o “bicho pega prá valer”. A região abriga cinco comunidades: três em Pariconha, uma em Água Branca e uma em Inhapi. Em alguns desses locais, a situação é de pobreza extrema, com indígenas sem ter posse de um mínimo pedaço de terra e obrigados a alugar um chão, para garantir o sustento possível.
“Imagina ter que alugar um pedaço de terra, para conseguir plantar alguma coisa para comer. Quem não tem roçado, tem que buscar outras áreas. É tudo muito difícil”, desabafa a liderança Kalankó.
A luta dos indígenas por seus direitos tem se dado por meio da união dos povos, protestos públicos, notadamente na capital federal, Brasília, e principalmente com o acionamento do Ministério Público Federal (MPF), para fazer valer o que diz a Constituição do Brasil.
De acordo com Antônio, os programas sociais, sobretudo o Bolsa Família, são atualmente responsáveis pelo sustento das famílias indígenas.
Em Palmeira dos Índios, a situação econômica das aldeias é um pouco melhor. Através da agricultura familiar, as comunidades plantam frutas, tubérculos e hortaliças para consumo próprio. O excedente da colheita, porém, é comercializado em feiras na própria região, garantindo o sustento de todos.
As etnias alagoanas também enfrentam problemas nos segmentos educação e saúde. Cada aldeia possui uma equipe multidisciplinar de saúde para cuidar dos Índios, o que inclui um médico. Mas como não há especialistas, muitas vezes os pacientes deixam de ser encaminhados para receber atendimento especializado na área urbana, porque não há combustível disponível para abastecer os veículos, por exemplo, por falta de recursos.
Muitas das escolas faltam professores indígenas – o que seria obrigatório por lei – para ensinar as crianças das comunidades. Ainda assim, nas instituições, a história, a cultura, as tradições são mantidas às futuras gerações com o envolvimento das crianças. A maioria dos professores índios em Alagoas é formada através do Programa de Apoio à Formação Superior e Licenciatura Indígenas (PROLIND) da Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL), uma iniciativa do Ministério da Educação, implantado na gestão do então gestor Jairo Campos, ainda em 2010.
Mesmo sem acesso adequado à escola e à saúde, sem ter terra para plantar e colher, os indígenas tocam a vida com grandeza e esperança. Se apegam aos costumes, a cultura e a religião e continuam acreditando em um futuro melhor. A fé é engrandecida com costumes e rituais sagrados, que têm como pilares a força da natureza e os espíritos de antepassados, a quem chamam de encantados.
Na aldeia Karuazu, em Pariconha, os Praiás têm reforçado anualmente suas crenças através de cerimônias como a do cansanção. Ao final do ritual, homens, mulheres e crianças dançam juntos, pisam uma planta que arde, reforçando o simbolismo e a tradição que os mantêm fortalecidos, para seguirem na luta diária em busca de seus direitos constitucionais.
E esse encanto, vindo da mata, da água, do mineral, do fogo ou de espíritos, é que faz com que tenham a certeza que o dia seguinte será magicamente melhor. Talvez imaginem a materialização da poesia escrita pelo compositor baiano Caetano Veloso, que tão bem imaginou em um trecho da música Um Índio, de sua autoria:
... "Um índio preservado em pleno corpo físico
Em todo sólido, todo gás e todo líquido
Em átomos, palavras, alma, cor
Em gesto, em cheiro, em sombra, em luz, em som magnífico
Num ponto equidistante entre o Atlântico e o Pacífico
Do objeto-sim resplandecente descerá o índio
E as coisas que eu sei que ele dirá, fará
Não sei dizer assim de um modo explícito".
Assim seja.
Comunidades Indígenas em Alagoas
Tingui-Botó – Feira Grande;
Kariri-Xocô – Porto Real do Colégio;
Xucuru-Kariri – Fazenda Canto, Palmeira dos Índios;
Wassu Cocal – Joaquim Gomes;
Xucuru Kariri – Boqueirão, Palmeira dos Índios
Karapotó – Terra Nova, São Sebastião
Karapotó – São Sebastião
Kalancó – Água Branca
Xucuru-Kariri – Palmeira dos Índios
Dzubucuá – Porto Real do Colégio
Geripankó – Pariconha
Karuazu – Pariconha
Katokin – Pariconha